2008/10/10

tristeza e lealdade

O desfecho estava anunciado, mas nem sequer teve uma compensação que valesse um pouco que fosse: os deputados do PS votaram contra e, não anunciaram nenhuma medida concreta que desculpasse a hipocrisia e o oportunismo com que deixaram passar uma oportunidade, e com que sacrificaram sine die os direitos civis dos seus concidadãos homossexuais. Mas, mesmo sabendo que assim acabaria, eu não consigo deixar de estar triste. Quanto mais nos envolvemos maior é o tombo, e não é só pela queda em si. Ao seguir o debate que se ia estabelecendo em blogues, jornais e televisões (e acabou por não ser tão pequeno como isso), acabámos por ser confrontados com a estupidez, a fobia e — é verdade, ainda existe — o ódio. Em momentos como este, percebemos que o relativo conforto e aceitação com que vamos vivendo o nosso dia-a-dia é menor do que parece. E a nossa indignação é muito pequena. Regra geral, as várias estatísticas já realizadas apontam a percentagem de homossexuais na população para valores entre os 5% e os 10% — seja, no caso português, entre 500 mil e um milhão de pessoas — e, no entanto, durante os dias que antecedem a votação de um par de projectos de lei que visam aplicar a igualdade de direitos, em matérias que não só são essenciais para resolver as questões práticas das nossas vidas com os nossos companheiros, como contribuem para acabar com a homofobia, as poucas manifestações organizadas para pressionar os políticos e a opinião pública não mobilizam mais do que umas poucas dezenas de cidadãos. Talvez mereçamos os políticos que temos. Talvez a hipocrisia e oportunismo com que o PS adia os nossos direitos seja directamente proporcional à passividade com que nós suportamos e sofremos o insulto constante de sermos considerados cidadãos de segunda, cujos direitos são passíveis de ser adiados, discutidos, negociados e, de novo, deixados para outra altura. Mas eu não voto no PS, embora sabendo que é deles que dependerá necessariamente a aprovação de qualquer que seja o projecto que venha no futuro para concretizar a igualdade no acesso ao casamento, em 2009 não voto neles. Como posso eu dar o meu voto a um partido que, tendo tido a oportunidade de ma dar, se permite recusar-me a cidadania de pleno direito em nome de interesses eleitoralistas, quando outro partido houve que a prometeu no seu programa e apresentou a parlamento no projecto de lei pelo qual eu esperava e continuo a ansiar? O Bloco de Esquerda merece a minha retribuição e a minha lealdade e, a menos que a sua posição sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo mude, nas próximas eleições terá o meu voto.

7 comentários:

João Roque disse...

Gonçalo
sei que a minha posição não é coincidente com a tua, mas nem sempre podemos estar de acordo, embora no mais essencial - a necessidade de aprovar a lei - até estejamos...
Não me quero repetir no que disse noutros blogs, nomeadamente no "Felizes juntos" e no "A minha luz"; essa é a minha opinião, embora respeite a tua, claro.
Abraços amigos.

Gonçalo disse...

Olá pinguim, obrigado pelo teu comentário. De facto, não estamos de acordo: o tema já foi muito debatido — pode ser mais ainda, claro — mas a sua resolução não depende dos "amplos debates" que o PS reclama. Quanto à pertinência de o fazer agora, o que é que o impediria: a crise? Mas a crise é nova? ou é polémica? não está toda a gente uniformemente de acordo que é preciso ultrapassá-la? Um assunto exclui o outro?... De resto, o debate mais intensivo sobre a crise mundial instalou-se já muito depois de agendada a discussão sobre os projectos de lei do PEV e do BE. Sobre se isto se está a transformar num drama nacional, acho sinceramente que não, é apenas uma realidade triste, como tu dizes, que uma minoria da população deseja ver resolvida, e para o que, durante um curto espaço de tempo em que o tema se debateu, algumas pessoas tentaram fazer algum barulho para ser ouvidas — não vejo porque deveriam ser consideradas "apalhaçadas" (a menos que te refiras a algo que desconheço). Sobre adoptar animais em vez de adoptar crianças, diria que estamos a falar de alhos e bugalhos: adoptar animais não deveria substituir que se adoptem crianças, como resolver a crise não deveria ser substituto para corrigir o acesso a direitos que são fundamentais para todos, mesmo para os homossexuais. Finalmente, sobre o voto, eu percebo o que dizes, mas neste caso o PS teve um comportamento tão inacreditavelmente hipócrita e oportunista que me retirou a confiança que ainda me restava neles. Enfim, importante é que a lei venha a existir, e que recebas um abraço amigo.

Special K disse...

Neste assunto também não concordo com o Pinguim.
Não consigo perceber como se pode ser a favor de algo e votar contra. Inoportuno? Desde quando é que direitos e liberdades são inoportunos?
Por estas e por outras é que costumo votar no Bloco e vou continuar a fazê-lo.
Um abraço

Gonçalo disse...

Olá special, muito obrigado pelo teu comentário. Vamos lá ver o que nos reservam os próximos tempos e que proposta trará para a mesa o PS, quando chegar a altura. Entretanto o Miguel Vale de Almeida, no seu blogue, faz a proposta de criação de um movimento alargado de apoio à aprovação da lei, sem cedências, o que me parece uma boa ideia - já viste? Abraço.

João Roque disse...

Gonçalo
só uma ressalva; eu não fiz qualquer comentário sobre o caso da substituição da adopção de crianças por animais, que fique bem claro; nem sequer me pronunciei sobre a adopção; no único blog em que falei no assunto ("Apontamentos"), fui e sou absolutamente a favor da adopção de crianças por casais do mesmo sexo.
Abraço.

Anónimo disse...

Não foi desta, terá de ser doutra. Acho que a questão está definitivamente instalada na sociedade portuguesa, que tem tendência para abafar tudo o que seja incómodo (de resolver,entenda-se).
Num plano mais político, o PS saíu desta embrulhada mal na fotografia. Não sei o peso eleitoral que poderá ter uma atitude destas, pois o assunto só interessa mais directamente a uma minoria dentro de uma minoria, mas numas eleições renhidas os nossos votos contam!!

Gonçalo disse...

Olá pinguim, fica registada a ressalva ;-) Quando estiveres com ele, manda um abraço nosso ao Déjan. Boa viagem!

Olá rui, eu espero sinceramente que nas próximas eleições o PS sinta mesmo as consequências da decisão que tomou... Abraço.