2009/09/16

ambição

A ideia de que o voto é secreto serve mais para silenciar as nossas discordâncias democráticas do que para promover a democracia. Todos temos o direito de manter secretas as nossas opções pessoais, incluindo o voto, mas também temos o direito (e às vezes o dever) de o tornar "público".
Eu não sou um eleitor fiel a nenhum partido e sempre procuro escolher na boca das urnas aquele que mais se aproximou dos meus interesses, das minhas preocupações, dos meus projectos e das minhas convicções. Mas não vejo essa avaliação só numa perspectiva de proximidade, mas também na perspectiva da viabilidade.
Com isto diria que, neste ponto da situação, o meu voto das próximas legislativas só poderia ser concedido a um de dois "partidos": ou o Bloco de Esquerda (que propôs — e muito bem — o casamento e a adopção de forma igual para todos, independentemente da sua orientação sexual) ou o Partido Socialista (que deixou cair o projecto do Bloco, em votação na Assembleia da República, mas o incluiu entretanto e de forma objectiva no seu actual programa eleitoral).
Também diria que o meu voto não poderia ser dado nas próximas eleições à Coligação Democrática Unitária (a CDU ainda não entendeu que não há nenhuma razão para que os futuros casais do mesmo sexo não possam adoptar crianças), ao Partido Social Democrata (Ferreira Leite e Cavaco Silva juntos são obscurantismo demasiado para mim e para o País), ao Partido Popular ou a qualquer outro.
Como a escolha dos portugueses parece estar definitivamente comprometida entre o PS e o PSD, não creio que o voto no BE seja uma opção que sirva os meus interesses. Nas Europeias votei no BE, para dar vitalidade e sangue fresco à construção da Europa e também um sinal de atenção ao Primeiro-Ministro de Portugal, mas agora votar no BE é dar a vitória a Ferreira Leite! E isso não, nunca!

Não sou pessoa de preparar e enviar textos, filmes ou caricaturas sobre os políticos de que não gosto. Ainda que algumas vezes tenha recebido algumas, ridículas, de pessoas que deveriam ter mais um palmo de testa do que efectivamente têm... e eu tenho muita pena dessas pessoas. Se não tenho a iniciativa de as atingir com provocações engraçadas (que há muitas, é só escolher no catálogo do mau gosto, da piroseira pura), pelo menos essas pessoas têm contado com a minha resposta para saber que há quem pense diferente delas, quem também tenha ambição e outras perspectivas, mas não usa sistematicamente esses mesmos recursos. Hoje faço-o excepcionalmente com uma brilhante ilustração que parece ser do caricaturista António e que eu uso por via do blogue com ligação no título.

Talvez assim seja possível fazer avançar Portugal um pouquinho mais. E talvez também tu possas ajudar, porque isto diz-nos respeito a todos: a mim, talvez a ti ou até a um filho ou a um neto que possa um dia querer viver e crescer num país mais justo e onde também ele possa ser um cidadão verdadeiramente livre e não discriminado!...

17 comentários:

João Roque disse...

Luís
embora não o faça de forma sistemática (tenho mais com que me preocupar), já tenho deixado algumas alfinetadas a pessoas que ocupam lugares públicos e que por os usarem de forma incorrecta (interpretação subjectiva, é óbvio), me fazem despoletar a inclusão de textos, imagens ou vídeos pouco abonatórios das ditas pessoas; exemplos recentes disso são AJJardim, MFL e MMGuedes.
E, devo admiti-lo honestamente, não me sinto arrependido de o ter feito.
Abraços.

Luís disse...

Olá!
Eu sei que tu és dos que têm o hábito de enviar filmes "de tudo" e a "todos". Tanto que já te pedi que não nos enviasses, a não ser que achasses serem dos nosso particular e especial interesse. E tu assim tens feito e por isso te agradecemos.
Mas há quem não faça coincidir "a cara com a careta" (p.e. gays a apelar ao voto no PSD), a não ser com a careta que não têm e desejam obter por essa via... Ou que são cegos a tanta coisa e acham que é simplesmente de "bom gosto" ser contra o governo e, mais especificamente, contra o Sócrates... Há tantos casos, tantos exemplos...
O que eu disse é que não alinho nessas coisas mas que, quando me calham, faço saber que penso diferente e faço saber porquê! É isso que marca a verdadeira diferença e ajuda a clarificar ideias, sobretudo se elas se desenvolverem no debate, na troca, na partilha... O que nunca me aconteceu porque aqueles que recebem a minha resposta devem achar-me burro ou desprezível, quase de certeza. O que pouco me importa... Importa-me, sim, o Governo que teremos após as legislativas e o que esse governo fará dos nossos futuros.
Logo após o 25 de Abril, o General Galvão de Melo (do CDS) dizia que a revolução não tinha sido feita para os homossexuais. E com isso calou-nos a todos, durante muito tempo. Mas já é tempo - e esta é a oportunidade - de termos o nosso próprio 25 de Abril. Já é tempo de aceitar a homossexualidade como algo tão diferente e tão normal quanto as dicotomias entre mulheres e homens, entre pretos e brancos. Seremos capazes de evoluir, uma vez mais?...
Abraço, cheio de esperança e ambição!

Anónimo disse...

Eu não consigo ver a decisão de um voto de forma tão simplista: só pensar votar nos partidos que apoiam o casamento entre pessoas do mesmo sexo. (esta foi a forma como eu li o post...)

Se assim fosse, só poderia votar no Bloco de Esquerda, pois o PS falhou e foi(e é) incoerente.

Por exemplo, visto da perspectiva de um professor gay que discorda da política educacional do Sócrates? Vai votar PS ou não? Entra em loop e rebenta os fusíveis?

Daí que eu teime em que as questões LGBT têm de ter uma base/raiz social e evitar colarem-se EXCLUSIVAMENTE a partidos...
Eu acho que o Miguel Vale De Almeida irá dar visibilidade às questões LGBT mas não acredito que consiga captar assim tantos votos...
Se o PS já falhou uma vez, poderá fazê-lo outra vez...

Daí que concorde com a última parte do post: Mas já é tempo - e esta é a oportunidade - de termos o nosso próprio 25 de Abril. "Já é tempo de aceitar a homossexualidade como algo tão diferente e tão normal quanto as dicotomias entre mulheres e homens, entre pretos e brancos."

Primeiro, nós... (quiçá com um Miguel Vale De Almeida a fazer a vez a um "Milk")
Depois juntos, vamos ter com os outros.

Luís disse...

Olá amigo 'engine', obrigado pelo teu comentário. Procurarei esclarecer-te e contra-comentar, como deves esperar de mim:

1) Porque me sinto um cidadão "incompleto", de segunda categoria, só posso escolher entre os partidos a apoiam claramente a alteração da legislação, no sentido de eu poder casar com o meu companheiro. Que eu saiba são o BE, a CDU e o PS apenas. E será entre estes que eu farei a escolha que depende de outros valores e de outras propostas;

2) Eu também fiquei horrorizado com a posição do PS quando o BE e a CDU apresentaram as suas propostas na Assembleia da República. Mas, ainda que não concorde com as explicações então apresentadas pelo PS, eu entendo-as e aceito-as no momento presente. Sobre isso eu já escrevi uma entrada, na data devida, que pode ser relida por ti e por quem mais lhe interesse;

3) Eu não sou um professor gay, pois não sou professor. Será a um professor gay que deverás colocar a questão. O que não significa que eu não tenha uma opinião de não-professor sobre o assunto. E eu sempre me disse livre para pensar. É possível que se eu fosse professor pudesse votar contra o PS, mas também é possível que não estivesse de acordo com os movimentos contestatários que se têm visto. Ambas as situações seriam possíveis e em consciência eu não te posso responder. Um professor talvez;

4) As questões LGBT deveriam ter essa base a que te referes mas em Portugal (e no Porto especialmente, para não falar noutras regiões do País) a base/raiz social é abafada pela sociedade e pelas suas preocupações consumistas e elitistas. Em Portugal não há uma associação que fale por nós: há várias, muitas, demasiadas, e cada qual fala à sua maneira. É a conhecida expressão "dividir para conquistar" que faz sentido aqui...;

5) Eu nunca pensei na questão do Miguel Vale de Almeida como forma de captação de votos, mas é verdade que terá esse lado também. Eu vejo o Miguel como o primeiro deputado português abertamente homossexual e como uma voz "gay" (com a qual espero estar quase sempre de acordo) na política. Além de que ele e o PS falharão como todos nós, muitas vezes, mas também poderão fazer muitas conquistas. Eu acredito no Miguel, indistintamente do partido;

6) Gostaria de saber como pensarias se fosses mulher no tempo em que não podias ter os direitos do homem, ou preto no tempo em que não podias ter os direitos do branco. E gostaria de saber em quem votarias se um dos dois partidos que irão formar o próximo Governo te desse a possibilidade de acabar com essa diferenciação? A mudança vem primeiro pela Lei, só depois é que a sociedade a integra, e não ao contrário;

7) Não me parece que o Vale de Almeida seja o Milk português. Mas entendo a comparação e, nesse sentido, espero também que sim!

"Depois juntos, vamos ter com os outros"?... - explica-me essa parte, pois deve ser óbvia mas não a entendi.

Um abraço grande e faz o favor de contra-contra-argumentar ;-)

(Desculpa alguma eventual gralha, mas não vou ter a oportunidade de reler de imediato o que escrevi. Fica assim mesmo, portanto.)

Gonçalo disse...

Pessoalmente, reduzi a questão à máxima simplicidade possível: ou vamos ter o Sócrates ou vamos ter a MFL. Eu já fiz uma escolha e sei em quem vou votar, mas não consigo entender que as pessoas estejam dispostas a ter a Manuela Ferreira Leite para não ter o Sócrates, juro que não entendo...

Anónimo disse...

Eu vou responder já ao Gonçalo, por ser uma resposta mais rápida, mas prometo que respondo ao Luís (porque tem mais prova para digerir):

Eu não quero nenhum deles: e nunca votaria num deles para não ter o outro. Eu não consigo fazer isso... :(

Pois mesmo que eu assim fizesse, teria que gramar com um deles, tal como tive de aguentar o Sócrates e como vou aguentando o Cavaco...

Prefiro ser casmurro e continuar a votar Bloco, até eles formarem governo e provarem que são iguais aos outros... ;)

Gonçalo disse...

Fair enough, engine. Como deve ser óbvio, o meu comentário não se dirige a quem vota BE convictamente...

Luís disse...

Engine: eu ficarei à espera do teu prometido comentário, adiantando-te desde já que vais ter respeito e luta ;-) Além disso registo que talvez a tua esperança seja a de que o BE possa vir a formar governo e provarem que são DIFERENTES dos outros... Só assim parece fazer sentido :-) Abraço grande, bom fim-de-semana,

Fernanda disse...

Se o PS apoiasse assim tanto o casamento entre psssoas do mesmo sexo tinha aprovado a proposta do BE em vez de entrar em politiquisses... perdemos um excelente oportunidade para entramos nos países mais evoluídos do mundo. Assim...temos de estar á espera que o PS ganhe as eleições em vez de votarmos em que queremos. Uma tristeza termos de voltar ao voto util

Mas também votar num cadáver que diz que só se pode casar para ter filhos... e quem não pode ou não quer?

Gonçalo disse...

Olá Fernanda, obrigado pelo comentário. No nosso caso trata-se, de facto, de voto útil mas não só: primeiro, porque não achamos como quase toda a gente parece achar que tudo o que Sócrates fez foi mau ou medíocre; segundo, porque não acreditamos, como muita gente parece acreditar, que a Manuela Ferreira Leite é mais séria e percebe muito mais de economia (ou não tivesse ela já más provas dadas nessa matéria)... Mas em última análise o voto no PS é mesmo um voto útil e, na nossa opinião, absolutamente necessário nesta altura.

Anónimo disse...

Olá aos dois, eu nunca fico chateado pela troca saudável de opiniões, porque mesmo que fiquemos como estávamos no início, sempre deu para debatê-las. J

Das vossas respostas eu já fiquei a perceber que apoiam e/ou defendem a(s) política(s) do PS e não meramente porque este promete que defende o casamento entre pessoas do mesmo sexo (e um dia destes irá apresentar legislação antes dos outros partidos, para não parecer que vai atrás dos outros, ou seja, pondo os interesses do partido à frente dos interesses das pessoas… o que é uma abnegação digna de louvar… J )

Estou a ver que não darias um bom político: falta-te o sentido de oportunidade (ou oportunismo)… ;) A relação Miguel Vale de Almeida -PS é vantajosa para ambos: o lado do Vale de Almeida foi bem explanado por ti; o lado do PS explicou eu: da mesma maneira que a PT lançou o Meo Fibra (e o Bloco trouxe as questões LGBT para a política), a Zon também quis ter uma parcela do “negócio” (tal e qual como o PS está a fazê-lo), mesmo que na realidade o produto não seja totalmente “fibra”… mas há que apanhar o comboio. ;)
Mas como penso que ambas as partes estão consistentes, eu não vejo nenhuns problemas… de certeza que teremos benefícios!

E claro que o Vale de Almeida será o Vale de Almeida. J A semelhança entre ele o Milk é que está a defender os direitos LGBT dentro do sistema, de forma credível e construtiva, sem ter de fazer corridas de tairocas ou sem lançar a pochete…
Algo ainda não consegui ver por parte das associações da ”área”…

Não consigo perceber porque é há tanta associação… e que distribui tanto preservativo (eventualmente subsidiado pelo Estado… mas não me vou alongar neste aspecto, porque até acho que tenho uma posição demasiado conservadora J )
A frase "Depois juntos, vamos ter com os outros" tem a ver com isso mesmo: só depois de nós, LGBTs, estarmos juntos é que poderemos ir ter com os outros (a Sociedade).

Eu discordo com “A mudança vem primeiro pela Lei, só depois é que a sociedade a integra”, pois os exemplos que mencionaste a segregação racial e sexual, foram eliminadas (ou reduzidas) à custa de movimentos e lutas sociais e não apenas pela alteração legislativa.
As alterações à Lei só fazem sentido se existirem pessoas que sirvam de fundamento, pois como se comprova pela História, nem todas a Leis foram/são justas. No cúmulo, ainda podemos ter alguns partidos conservadores dizerem que não há gays… (pois não, eles estão todos casados com mulheres e vão à missa no Domingo… e fazem jogging à noite pelo Parque Eduardo VII, porque essa é o único tempo que têm disponível, depois de tantas horas de trabalho).

Mas mais do que apenas mostrar pontos de vista diferentes, eu gostava de avançar e construir algo mais (até parece que eu fui que escrevi os slogans da CDU).
Marcar o passo no mesmo sítio, acaba por desanimar… (e gastar as solas).



(Nem reparei se houve gralhas… agradeço que retribuam ;) )

Luís disse...

Engine: estive mais de uma hora a escrever-te uma resposta e perdi-a!!! Voltarei depois, mas talvez até lá o Gonçalo ainda te possa dizer algo... Sorry :-(

Anónimo disse...

Luís, essa lição eu já a aprendi: eu escrevi o meu texto no Word e só depois é que o passei para a net! ;)

Mas tens tempo, as eleições são só no Domingo ;)

Gonçalo disse...

engine, pela parte que me diz respeito, não é propriamente que apoie e/ou defenda a(s) política(s) do PS, é só que não as acho tão más como as pintam e, globalmente, sim, superiores às deste PSD. Mas o voto no PS é basicamente um voto útil, na via que me parece, neste momento, a mais rápida e segura para uma alteração da lei do casamento civil. E é verdade que esse desejo suplanta todos os outros que eu possa ter (de forma realista) relativamente a outras áreas de intervenção do governo. Abc.

Luís disse...

Engine: acho que mais logo vou ter de novo uma hora para reflectir sobre a resposta adiada. Fica a intenção, se não a promessa... Abraço,

Anónimo disse...

Estejam à vontade: as linhas que já trocámos deixam clara a ideia de que não vão votar no PS "só" por causa deste voltar a pegar no casamento entre duas pessoas.

Sim, porque a MLF pode querer meter medo, mas não é o suficiente... :)

Luís disse...

Olá de novo, 'engine' e muito obrigado pela "folga" que mes deste (é mais uma dispensa, e ainda bem), mas não queria que este dia chegasse ao fim sem te/nos desejar boa sorte. E enviar um abraço de amizade,