2010/02/18

mais abril

Vem agora o senhor general Garcia Leandro (ver notícia pela ligação acima) e um grupo de 25 militares de Abril insinuar em conferência de imprensa que o casamento entre pessoas do mesmo sexo é uma "aberração". Ora, um 25 de Abril que deixou de fora a igualdade de direitos das minorias sexuais é que poderia (sublinho, poderia) ser considerado uma aberração. E fiz o sublinhado porque é ainda ao 25 de Abril aonde nós vamos hoje beber a inspiração para as mudanças sociais que nos levam mais além. É lá que estão todos os valores que nos têm norteado nas últimas décadas e onde falta ainda cumprir este desígnio.
O senhor general, os restantes militares e os populares que os apoiam não devem fazer ideia do que é viver às escondidas uma relação de amor, fidelidade e partilha, que é a de um casal como nós. Não fazem! Devem imaginar que os homossexuais são todos uns palhaços (muitos são-no, como o são também muitos heterossexuais) e devem supor que os homossexuais são todos infiéis e pedófilos (alguns sim, como o são também muitos e muitos mais heterossexuais). O 25 de Abril tem um significado que cresceu com o passar dos anos, das décadas, das gerações. Eu próprio fui militar e inclusivamente fui-o no quartel que simbolicamente ficou mais ligado à Revolução, ainda que só uns anos depois de 74. Sei o que é ser homossexual e ser militar, numa altura em que eu queria ainda acreditar que a homossexualidade era uma fase da adolescência e que essa fase começava a ficar para trás, com a chegada da idade adulta. Mas enganei-me e enganei alguns que me rodeavam. Descobri depois o amor e o amor que não distingue sexos. Apaixonei-me pelo meu companheiro em 1986 e vivo essa paixão e essa relação exclusiva até hoje. Exactamente como um típico casal heterossexual, excepto naquilo em que não pôde ser igual.
Ao senhor general, aos senhores militares e a todos os que têm ainda dúvidas eu observo: não pensem que é fácil para mim (e para pessoas como eu ou como nós) dar o passo do casamento; casar é uma vontade que vem de um justo e inegável direito à igualdade, ao reconhecimento e ao respeito social; à integração; casar é unir duas famílias, é reforçar os laços, é abrir os braços e esperar um outro par de braços abertos do outro lado; é entrega; é partilha; é passar do anonimato, de uma certa clandestinidade, à identidade, a dizer "eu sou" e "nós somos" e isso ser reconhecido; é dizer "eu amo" e ser amado, respeitar e ser respeitado; é assumir compromissos, usufruir plenamente dos direitos e cumprir todas as obrigações derivadas do casamento; é ter o direito de casar e a opção de o fazer quando quiser; é respeitar as normas sociais e ser respeitado pela sociedade; é ser mais igual, mais Abril!...

8 comentários:

Major Tom disse...

pssst
precisava de vos enviar um e-mail. como faço?

Luís disse...

lavionrose(at)sapo(dot)pt
Ficaremos atentos! :-)

João Roque disse...

Acho que não necessito de apresentar credenciais para justificar todo o meu júbilo pelo 25/4 e pelo que esse facto contribuiu para o nosso país.
O papel dos militares nessa altura foi fundamental, é óbvio, mas também e desde logo um membro da Junta de Salvação Nacional, Gen. Galvão de Melo, afirmou acerca de um início de reivindicações dos direitos dos homossexuais que a revolução não havia sido feita para defender as prostitutas e os homossexuais...
Agora, 36 anos passados, os militares de Abril deveriam resguardar-se para as homenagens que lhes são devidas e não pretender fazer parte de um grupo de opinião para o qual não estão , nem nunca estiveram vocacionados; daí esta patética "mensagem" me parece mais uma tentativa de "prova de vida" de um grupo de cidadãos que na sua actividade está morta há já alguns anos.
Abraço.

Luís disse...

A afirmação do general Galvão de Melo só parece demonstrar a ingenuidade com que o 25/4 foi feito. Mas hoje já é tarde demais para esse tipo de discursos. Os "teenagers" de então são hoje adultos e a revolução nunca chegou ao fim. Talvez seja tempo, agora, de os "velhos" generais completaram o que começaram, ou de deixar que os seus "teenagers" o façam. Qualquer coisa diferente disso é reaccionarismo. Mas que também os há, lá isso há!... Abraço,

Anónimo disse...

Parabéns pelo seu alerta e pela sua tomada de posição.
Na minha opinião, porém, e sendo eu um firme defensor do 25 de Abril, não se pode dizer que essa tomada de posição homofóbica do General Garcia Leandro - que, recorde-se, foi homem do 25 de Abri, mas também do 25 de Novembro - essa tomada de posição não pode ser tida como deslocada da causa do 25 de Abril. Simplesmente porque não houve uma, mas várias causas, não um mas vários 25 de Abril.
O General Garcia de Leandro, como muitos outros, não é do meu 25 de Abril.
A causa política da plena igualdade é mais avançada que a do 25 de Abril.

Um abraço,
Francisco Herculano

Luís disse...

Francisco: obrigado pelo seu comentário e testemunho. Esperamos encontrá-lo mais vezes por cá... Um abraço,

Snl disse...

O problema é que eles sabem exactamente o que é andar às escondidas! MAS, pensam que é tarde demais para falar de outras coisas!

Luís disse...

Os militares não são muito mais entendidos no uso de camuflagem do que os civis. Tu olhas à tua volta e não vês "ninguém" (nenhum homossexual), mas eles/elas estão por aí, em todo o lado, diz-se algures que na proporção de 1 para 9. Parece que é facto que temos homossexuais na política que estão a fazer campanhas contra a "dessexualização" casamento. É dito é boca aberta... Em que ficamos?...